Uma outra linguagem
Terminei uma formação de 3 anos em TaKeTiNa, processo que usa o ritmo para transformar corpo e mente. Quando alguém me pergunta sobre os aprendizados, nunca sei o que dizer. Tal incapacidade de comunicar experiências profundas me causa uma certa solidão. Como é que não consigo falar do que mais importa?
Sem contar pessoas específicas, como coletividade ainda não desenvolvemos uma linguagem que dá conta de descrever nossos mundos sutis. Boa parte de nossa vida é feita de experiências internas, porém a maioria de nossas conversas gira em torno de fatos externos — é como se 90% do que somos passasse batido, sem ser visto nem comunicado. Apelamos para dois extremos tentando escapar dessa falta: damos uma cara positiva para a incapacidade (“Sem palavras!”) ou disparamos descrições grosseiras (“Isso é coisa do meu subconsciente”).
Por não acessar muitas de nossas áreas internas, acabamos não nos relacionando a partir delas. Desses becos que não reconhecemos nem abrimos aos outros, surgem mil problemas que tentamos atacar superficialmente, sem alcance. Dá para transformar aquilo que não conseguimos sequer chamar?
Tente dar orientações para uma pessoa no trânsito sem usar “direita” ou “esquerda”. Estamos nessa condição em relação aos fenômenos mentais e emocionais. Há um abismo gigantesco entre artigos acadêmicos de psicologia ou neurociência e nossa experiência vivida em primeira pessoa, o que encontramos ao olhar para dentro. Precisamos aprender mais com Espinosa, fenomenologia, Francisco Varela, ciências cognitivas, budismo ou qualquer tradição contemplativa na qual muitas pessoas observaram suas mentes e deixaram descrições acuradas.
A arte ajuda a ampliar nosso repertório, mas não é suficiente. Para refinar nossa linguagem, é necessário desenvolver a atenção, afiar a cognição, se familiarizar com a própria mente e com o próprio corpo. Como a gente funciona por dentro? Como as emoções regulam nossa energia? Como podemos detectar os micro mecanismos que nos fisgam? Será que há outros modos de conversar sobre nossas experiências com mais detalhamento e profundidade?
Não duvido que dessa exploração surjam mais metáforas e até novas palavras para falarmos do que importa. Mais ainda, boa parte desse processo de conhecimento e compartilhamento de nossos mundos internos envolve meios não-verbais, como rodas de TaKeTiNa, de salsa cubana (rueda de casino), de capoeira, de tambores, de sonho (Investigação Apreciativa), de meditação silenciosa…
Espero te encontrar numa dessas por aí.
* Originalmente publicado na revista Vida Simples (outubro 2012).