O que a raiva não é – Robina Courtin

por Isabella Ianelli

Traduzi um trecho desse ensinamento da Venerável Robina Courtin, publicado em abril de 2013, no qual fica bem clara sua abordagem honesta, vigorosa e engraçada.

A resposta perfeita para a pergunta “O que é a raiva?”, que eu ouvi de um lama, é: “A raiva é a resposta quando o apego não consegue o que quer.” Se é isso que a raiva é, então o que ela não é?

A raiva não é física

A raiva faz parte de nossa mente, e nossa mente não é física. Ela existe na dependência do cérebro, dos genes, das reações químicas, mas ela não é essas coisas.

Quando a raiva é forte, desencadeia enormes sintomas físicos: o sangue ferve, o coração bate rápido, a saliva sai da boca, os olhos se arregalam em pânico, a voz grita. Ou, se experimentamos uma aversão, como depressão, o corpo parece um peso de chumbo: não temos energia, há uma inércia terrível. E, então, quando aumentamos nossa serotonina, o corpo se sente bem novamente.

Mas essas são apenas expressões grosseiras do que é puramente pensamento: uma história inventada por nossa mente conceitual que exagera os aspectos feios da pessoa (ou do evento ou de si mesmo). Pesquisas recentes provam o que é explicado na medicina tibetana: o que acontece na mente afeta o corpo.

A raiva não é culpa do outro

Isso não significa que o outro não me deu um soco, claro que deu. E isso não significa que me dar um soco não é ruim, claro que é. Mas o outro não me deixou raivosa. O soco é meramente um catalisador da minha raiva, uma tendência da minha mente. Se não houvesse raiva, tudo que eu ganharia é um nariz quebrado.

A raiva não vem dos nossos pais

Nós amamos culpar nossos pais. Na verdade, se Buda estiver errado em sua afirmação (de que nossa mente vem de vidas anteriores e é impelida pela força de nossas próprias ações passadas para o útero de nossa mãe), e se os materialistas estiverem certos em afirmar que nossos pais nos criaram… Então devemos culpá-los. Como eles ousaram me criar, como Frankenstein e seu monstro, me dando raiva e ciúme e tudo mais? Mas eles não fizeram isso, o Buda diz. Nem um ser superior fez — mas não ousamos culpá-lo!

Nossos pais nos deram um corpo, o resto é nosso (incluindo as qualidades boas).

A raiva não é só gritaria

Só porque uma pessoa não grita e berra não significa que ela não está com raiva. Quando entendemos que a raiva é baseada em um pensamento chamado aversão, então nós conseguimos ver que nós todos somos raivosos.

Claro que, se nunca olharmos para dentro, nós não vamos perceber essa aversão — e é por isso que pessoas que não expressam a raiva tendem a vivenciá-la como depressão ou culpa.

A raiva não é necessária para uma ação compassiva

Sua Santidade o Dalai Lama respondeu a um entrevistador que sugeriu que a raiva parece agir como um motivador para uma ação:

“Eu sei o que você quer dizer. Mas com raiva, seu desejo de ajudar não dura. Com compaixão, você nunca desiste”.

Nós precisamos discriminar o bom do mau, mas Buda disse que nós devemos criticar a ação, não a pessoa. Como Martin Luther King Jr disse, tudo bem encontrar falhas — mas, então, devemos pensar: “O que eu posso fazer sobre isso?”. É exatamente o mesmo com nossos próprios erros. Ao invés de nos sentirmos culpados, devemos pensar: “O que eu posso fazer sobre isso?”. Então, podemos mudar. Raiva e culpa são paralisantes, impotentes, inúteis.

A raiva não é natural

Frequentemente pensamos que precisamos de raiva para sermos humanos razoáveis, que não é natural não ter raiva, que a raiva dá perspectiva para nossas vida. É um pouco como pensar que para apreciar o prazer nós precisamos da dor. É óbvio que isso é ridículo — para eu apreciar sua bondade, primeiro você precisa me dar um soco no nariz?

A raiva não está no centro do nosso ser

Sendo a raiva um estado delusório da mente, uma mentira, um engano, é claro que a raiva pode ser eliminada.

Se eu acho que tem dois copos na minha mesa, enquanto só há um, isso é um engano. O que fazer com o pensamento “Tem dois copos na minha mesa”? Removê-lo da mente. Reconhecer que só há um copo e parar de acreditar na mentira. É simples.

Claro, as mentiras que acreditamos de que sou auto-existente, de que objetos deliciosos me fazem feliz, de que os feios me fazem sofrer, de que minha mente é meu cérebro, de que alguém me criou — essas mentiras estão sendo contadas na minha mente desde tempos imemoriais.

Mas o método para se livrar desses enganos é o mesmo. O que resta quando removemos as mentiras e as delusões é a verdade de nossa própria bondade inata, completamente perfeita. É isso que é natural.

Ensinamentos de Ven. Robina Courtin para o Brasil

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